quarta-feira, 29 de junho de 2016

O chamado de Pedro


Os Apóstolos de Jesus e os discípulos que a eles se juntaram eram pessoas provenientes do ambiente popular, com atividades diversificadas. Vários deles eram pescadores profissionais. O Mar de Tiberíades, também chamado Mar da Galileia ou Lago de Genesaré, era o espaço de trabalho e convivência. Pregações, milagres, caminhadas, muitas das atividades de Jesus se desenvolveram ali, num sobe e desce de barcos, ventanias, redes, peixes, comércio no mercado, suor, cansaço, horas de expectativa dos peixes, que nem sempre vinham, famílias que dependiam daquele trabalho, um conjunto de vida e atividade certamente muito carregado de humanidade e lutas, temperado também com muitas alegrias.
É para o lago que retorna Pedro, seguido de seus companheiros. Não lhes era ainda claro tudo o que viria a acontecer, se pensarmos na origem simples daqueles homens, que não eram especialistas em profecias, letras da lei ou mesmo na novidade do próprio Evangelho. Era um mar de novidades, num mar de ideias confusas. Sabemos que foi depois do derramamento do Espírito Santo que aqueles homens adquiriram a ousadia (Parresia!) necessária para pregar, constituir as primeiras comunidades cristãs e derramar o próprio sangue pela Igreja e pela causa do Reino! Tinham que aprender muito, e o Senhor aproveita a aparente volta à profissão de pescadores para oferecer-lhes e a todos nós preciosas lições (Jo 21, 1-19).
Seis pescadores profissionais chegam à madrugada sem qualquer fruto do trabalho. Barca e trabalho na barca de Pedro, que sabemos ser a Igreja, não leva a nada sem a presença do Senhor. O lusco-fusco da madrugada mostra uma figura na praia. É que a experiência da fé exige mesmo amadurecimento! Jesus os provoca, perguntando sobre algo para comer. Nem sabiam que da Ressurreição para frente quem oferece o alimento que perdura para a vida eterna é Jesus! É João, o discípulo amado, que proclama com força “é o Senhor”, pois o amor verdadeiro faz enxergar no meio da escuridão dos acontecimentos!
Redes lançadas pela força da Palavra de Jesus, frutos em profusão! Começa uma nova mudança em Pedro, que culminará em mais um chamado! O homem nu se reveste agora de sua inusitada missão. Corre até Jesus, mas parece-me ver o próprio Jesus entrando na barca do coração de Pedro! Chegados à praia, é Jesus que havia preparado tudo. O Mestre e Senhor se faz mais uma vez servidor. Uma refeição oferecida por Jesus é sinal daquela que o mesmo Senhor oferece todos os dias, até o fim dos tempos, na Eucaristia. Além disso, a rede da Igreja tem cento e cinquenta e três grandes peixes, e esta rede nunca vai se romper, podendo acolher, na contínua festa eucarística da misericórdia, todas as gerações, até que ele volte outra vez. É a abundância do tempo novo inaugurado pelos discípulos capazes de se lançarem na fidelidade à ordem do Senhor. Eles têm alguma e muita coisa para oferecer! Igreja é assim! Deus recebe, Deus se doa, suscita a maravilhosa comunhão em que Céu e Terra compartilham seus dons! É claro que ninguém mais se atreve a perguntar nada, pois é certa a vinda e a presença do Senhor.
Mesa preparada, convivas que se alimentam, corações pulsantes pela emoção de mais uma aparição do Ressuscitado. A virada de página para um novo chamado tem no Senhor a iniciativa. Pedro, que três vezes havia negado conhecer o Senhor, agora não precisa do canto do galo para desatar suas lágrimas.
Lições para a Igreja e para todos nós. Ninguém pense em singrar qualquer mar sem a presença de Jesus no barco da vida! Não dá certo! E as noites e os dias serão estéreis! Na escuridão do tempo ou das crises pessoais, comunitárias e sociais, descobrir gente que às vezes tem “pouca leitura”, mas muita percepção das coisas de Deus. A luz pode chegar através de tais pessoas! Quando parece que o mar não está para peixe, na aventura diária da existência, apostar naquele (“É o Senhor!”) que manda jogar as redes onde nem poderíamos pensar. Ao chegar às muitas praias que a vida oferecer, levar o que tivermos, sabendo que as redes agora repletas não se romperão! Depois aceitar a gratuidade daquele que se assenta em torno de um fogo aceso e se faz servidor, oferecendo o alimento que dura até a vida eterna.
Os apóstolos de Jesus devem ter comentado tais acontecimentos, depois de passados a Ascensão do Senhor e o Pentecostes, quando tiveram a lucidez necessário para montar o verdadeiro quebra-cabeça que lhes tinha sido oferecido por Deus. Há uma linha mestra que lhes serviu de guia para a vida e o apostolado e iluminam nossa vida. O chamado de Deus é gratuito, parte de seu amor infinito que vai ao encontro das pessoas, sem depender de suas qualidades ou eventuais defeitos. Deus tem a paciência necessária para cercar de amor e infinitas iniciativas ou repetidas perguntas a respeito de nossas disposições. Há um olhar pessoal de Deus, que nos leva a sério, mostrando-nos alternativas, novas possibilidades de serviço ao seu Reino, para o que ele nos oferece os dons necessários. Ninguém pense que tudo está definido e muito explicado nas medidas humanas que desejamos muitas vezes impor a Deus. Antes, ele é mais criativo do que nós e encontrará sempre o modo para surpreender-nos. Estejamos atentos, porque mesmo quando passamos anos fugindo dele, numa noite de suor, sobre o barco em alto mar, ele se mostrará. Quando as luzes de nossa limitada inteligência parecerem insuficientes, é hora de dizer, com o Apóstolo e Evangelista São João, que “é o Senhor”!
Se forem corajosas nossas respostas, diante dos grandes desafios de nosso tempo, que podem levar-nos a “baixar a guarda” diante das tentações, e poderemos dizer como Simão Pedro, aquele que, convertido, foi chamado a confirmar os irmãos: “É preciso obedecer a Deus, antes que os homens” (At 5, 29). Aliás, é hora dos cristãos assumirem posições ousadas!                                                                                                                                 "Tu sabes de tudo, sabes que eu Te amo"
 Dom Alberto Taveira Corrêa - Arcebispo de Belém do Pará - Assessor Eclesiástico da RCCBRASIL


sexta-feira, 24 de junho de 2016

Amai-vos como Eu vos amei



Fomos chamados por Deus à novidade de vida, a participar de sua maravilhosa obra, que aponta para o alto e para frente. O Apocalipse nos faz sonhar alto! “Esta é a morada de Deus-com-os-homens. Ele vai morar junto deles. Eles serão o seu povo, e o próprio Deus-com-eles será seu Deus. Ele enxugará toda lágrima dos seus olhos. A morte não existirá mais, e não haverá mais luto, nem grito, nem dor, porque as coisas anteriores passaram”. Aquele que está sentado no trono disse: “Eis que faço novas todas as coisas” (Ap 21, 3-4). O quadro social, político e econômico em que se encontra o mundo, em nossos dias e aqui, bem em nossa pátria, parece contradizer o que, sendo sonho de Deus, deveria tornar-se projeto da humanidade. É impressionante como se espalha o confronto e o ódio entre as pessoas, a violência se instala, os grupos e partidos, cuja vocação deveria ser o cultivo da legítima diversidade, tornam-se adversários e inimigos. Da vizinhança, passando pelas ruas, estádios, praças e a sociedade, chega às raias do absurdo o quanto se pretende eliminar o diferente, sejam quais forem as bandeiras empunhadas pelas muitas partesenvolvidas.

Há muito tempo atrás (Cf. At 14, 21-27), Paulo e Barnabé, da primeira geração de cristãos, empreenderam viagens missionárias, nas quais primaram pela criatividade e solicitude. Algumas atitudes assumidas por eles podem iluminar nossos dias e a desafiadora tarefa dos cristãos, chamados a serem neste tempo que se chama “hoje”, anunciadores da Boa Nova do Evangelho. A todos afirmavam ser necessário “passar por muitos sofrimentos para entrar no Reino de Deus” (Cf. At 14, 23). É ilusório pretender um mundo renovado sem a entrega da própria vida, inclusive com a prontidão à imolação e ao derramamento do próprio sangue. Não nos enganemos! Nossa salvação e a salvação do mundo passam necessariamente pela Cruz! O enfrentamento dos obstáculos exige iniciativa, coragem para dar o primeiro passo na busca da reconciliação, prontidão para os esforços mais duros e exigentes, tudo ungido pela serenidade de quem busca acima de tudo a vontade deDeus.

Outra atitude notável foi a confiança que Paulo e Barnabé depositaram em pessoas escolhidas como presbíteros, gente de responsabilidade colocada à frente das Comunidades. No início dos Atos dos Apóstolos, tinham surgido outros servidores (At 6, 1-6), sete homens aos quais foi entregue o serviço da caridade, início do que hoje chamamos de Diáconos. De lá para cá, a Igreja foi sempre desafiada a discernir os caminhos indicados pelo Espírito Santo, valorizar os carismas, promover novas lideranças, ajudá-las a se prepararem bem, lançá-las a novas tarefas e identificar os desafios missionários, para sair de si mesma, para que todos, sem exceção, se lancem a campo, para que sejamos,naexpressãotãocaraaoPapaFrancisco,umaIgreja“emsaída”, formada por discípulos que sejam efetivamente missionários! Assim, anunciaremos a Palavra e poderemos contar uns aos outros como Deus abre as portas da fé em nosso tempo (Cf. At 14,25.27).

Entretanto, por mais que nos esforcemos, os recursos humanos são limitados, nossas forças são desproporcionais ao tamanho do desafio. Só no Céu está a solução! O cristianismo não é um código de leis destinadas ao bom comportamento ou, quem sabe, a normatização das relações sociais que constituem a cidadania. Em nosso país, multiplicam-se as leis, a organização de Conselhos, a regulamentação do convívio social, pretende-se unificar os programas educacionais, inclusive contendo princípios que contradizem nossas convicções religiosas e os valores morais e éticos. O resultado está aí, bem à nossa vista. Como falta o Céu como referência, a terra se estraga, mesmo com milhares de páginas escritas. Como faltam homens e mulheres renovados por dentro, o desastre se faz e searrasta.

No Céu está a solução. “Eu vos dou um novo mandamento: amai-vos uns aos outros. Como eu vos amei, assim também vós deveis amar-vos uns aos outros. Nisto conhecerão todos que sois os meus discípulos: se vos amardes uns aos outros” (Jo 13, 34-35). O segredo está na palavrinha “como”. Se as relações humanas forem apenas humanas, não levarão muito adiante a mudança da sociedade. O modelo está no Céu, do jeito como o Pai ama o Filho, o Filho ama o Pai e este amor é o Espírito Santo. O amor de Deus é sem medida, sem limites. Ele nos amou por primeiro, toma a iniciativa, tem a reciprocidade como princípio, não cobra do outro, entrega-se totalmente. Volto à palavra “sonho”. O desastre entre nós é justamente achar que o projeto de Deus é irreal, não tem o pé no chão, que realistas somos nós que fazemos treinamento de tiro ao alvo com olhares e gestos, para o duelo cotidiano!

O Apóstolo São Paulo (1 Cor 13, 4-7), depois de descrever os muitos dons e carismas presentes nas Comunidades cristãs, aponta o caminho que chama de excelente, no hino à caridade: “O amor é paciente, é benfazejo; não é invejoso, não é presunçoso nem se incha de orgulho; não faz nada de vergonhoso, não é interesseiro, não se encoleriza, não leva em conta o mal sofrido; não se alegra com a injustiça, mas fica alegre com a verdade. Ele desculpa tudo, crê tudo, espera tudo, suporta tudo”. O Papa Francisco tomou este texto como referência ao descrever, de modo surpreendente, o amor no matrimônio, na Exortação Apostólica “Amoris lætitia”, cuja leitura recomendo. Diante da grave crise da família em nossos dias, o Papa não tem receio de propor o modelo do Céu, quando propõe à família hodierna a paciência, como exercício da misericórdia, indica o caminho para que o amor seja recíproco e se manifesta na ternura do afeto e das obras, para penetrar toda a vida. Diz o Papa que convém cuidar da alegria do amor gratuito, ou insiste com os jovens no casamento por amor, ou dá “dicas” para o diálogo em família. Cabe a nós desfrutar estes ensinamentos e ampliá-los, como incendiários, partindo do fogo do afeto da caridade no lar, para alcançar as comunidades, passar pelas nossas ruas e chegar ao mundointeiro!
D. Alberto Taveira







sábado, 18 de junho de 2016

Comunicar o testemunho construído na Misericórdia



O reino será alcançado pela misericórdia, essa foi uma das mensagens que Jesus veio nos comunicar e ordenou que anunciássemos para todo o mundo (Mc 16,15). A ascensão é nitidamente a completude do que Jesus mostrou como caminho para seus seguidores e todos estaremos, se seguirmos seus passos, um dia, com Ele nos céus (Mt 19,28). No entanto, é necessário cumprir seus ensinamentos, assumir a missão e ser testemunhas.

Os apóstolos foram “formados, preparados, fortalecidos” para a grande missão de evangelizar todo o mundo, anunciar a misericórdia do Pai e testemunhar com a vida. Passaram mais de 3 anos com o Senhor, O viram ressuscitado, andaram com Ele, antes e depois da crucificação. Os Santos deram e dão esses testemunhos nas mais diversas realidades. Nós homens e mulheres, desse tempo, andamos com Jesus através da Santa Igreja, seu corpo, vivemos com o Senhor em sua palavra, apreendemos saberes na tradição dos santos apóstolos, recebemos Jesus Eucarístico continuadamente para comunicar através da vida. Assim, temos a luz necessária para nossa peregrinação e para auxiliar muitos.

A humanidade precisa de luz para seu caminho, a verdade deve ser mostrada para ser seguida. Assim, Jesus que encontramos continuamente e conhecemos precisa ser anunciado! O viver em Jesus, nesse tempo, precisa ser apresentado! O santo padre Francisco em sua mensagem para o dia das comunicações veio pedir essa ação frutuosa da comunicação para o mundo. Seja no meio que for, para muitas ou apenas uma pessoa, leigo ou ordenado é necessário ser fecundo! Todos os atos são comunicação, são testemunho, “O amor, por sua natureza, é comunicação”. Os nossos atos precisam ser de amor.

Não foram poucos os momentos em que Jesus disse aos discípulos que eles ficariam responsáveis por expor e levar essa misericórdia, esse amor para o mundo, pela disseminação da boa nova em toda a terra. Chega a ser engraçado os momentos em que São Pedro não entende as indicações de Jesus, momentos que nós, eu e você, também vivemos quando entendemos que a missão é “grande ou complicada demais para nós”. Jesus nos fala, que estará com o Pai intercedendo por todos nós, enviar o paráclito é a promessa dEle, e com o poder do alto vamos cumprir a nossa missão, o nosso chamado, viver a nossa vida. Receber continuamente o Espírito de Santo é a condição primordial.

Comunicar, anunciar, proclamar, fazer memória, tornar comum e de conhecimento de todos as obras de Jesus, as ações do Espírito Santo, a Misericórdia do Pai é o que forma a Santa Igreja, é o que ela é, testemunhar o que nós somos, somos puro testemunho de uma vida no Espírito Santo. O conhecer, reconhecer Jesus, apreender seus ensinamentos, cumprir suas ordens através da Santa Igreja são fases anteriores e condicionais para O encontrar nos céus.

Os grupos de oração são uma prova autêntica e contemporânea que essas práticas podem ser realizadas. Em todo o planeta os grupos acontecem, seus participantes fazem como os primeiros cristãos, encontram-se continuamente e levam essa experiência para os demais homens e mulheres. Neles, encontramos pessoas simples, intelectuais, universitários, religiosos, todos com uma visão espiritual para a edificação da civilização do amor. Nós fazemos o que o Santo Padre pede, comunicamos o amor.

 Airton Rocha - Coordenador Nacional do Ministério de Comunicação Social






sábado, 11 de junho de 2016

A CASA DE DEUS




 
  Esta é a casa de Deus! Este ano, no lugar do XXXII domingo do Tempo Comum, celebra-se a festa da dedicação da igreja-mãe de Roma, a Basílica de São João de Latrão, dedicada em um primeiro momento ao Salvador e depois a São João Batista. O que representa para a liturgia e para a espiritualidade cristã a dedicação de uma igreja, e a própria existência da igreja, entendida como lugar de culto? Temos que começar com as palavras do Evangelho: "Mas chega a hora (já estamos nela) em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade, porque assim quer o Pai que sejam os que o adoram" (João 4).



Jesus ensina que o templo de Deus é, em primeiro lugar, o coração do homem que acolheu sua palavra. Falando de si e do Pai, diz: "viremos a ele, e faremos morada nele" (João 14, 23). E Paulo escreve aos cristãos: "Não sabeis que sois santuário de Deus?" (1 Coríntios 3, 16). Portanto, o crente é templo novo de Deus. Mas o lugar da presença de Deus e de Cristo também se encontra "onde estão dois ou três reunidos em meu nome" (Mateus 18, 20). O Concílio Vaticano II chama a família de "igreja doméstica" (Lumen Gentium, 11), ou seja, um pequeno templo de Deus, precisamente porque, graças ao sacramento do matrimônio, é, por excelência, o lugar no qual "dois ou três" estão reunidos em seu nome.



Por que, então, os cristãos dão tanta importância à igreja, se cada um de nós pode adorar o Pai em espírito e verdade em seu próprio coração ou em sua própria casa? Por que é obrigatório ir à igreja todos os domingos? A resposta é que Jesus não nos salva separadamente; veio para formar um povo, uma comunidade de pessoas, em comunhão entre si e com Ele.



O que é a casa para uma família, é a igreja para a família de Deus. Não há família sem uma casa. Um dos filmes do neo-realismo italiano que ainda recordo é "O teto" (Il tetto), escrito por Cesare Zavattini e dirigido por Vittorio De Sica. Dois jovens, pobres e enamorados, se casam, mas não têm uma casa. Nos arredores de Roma, após a 2ª Guerra Mundial, inventam um sistema para construir uma, lutando contra o tempo e a lei (se a construção não chega até o teto, à noite será demolida). Quando no final terminam o teto, estão certos de que têm uma casa e uma intimidade própria e se abraçam felizes. Formam uma família.



Vi esta história se repetir em muitos bairros de cidade, em povoados e aldeias, que não tinham uma igreja própria e tiveram de construir uma. A solidariedade, o entusiasmo, a alegria de trabalhar juntos com o sacerdote para dar à comunidade um lugar de culto e de encontro são histórias que valeriam a pena levar às telas como no filme de De Sica.



Agora, temos que evocar também um fenômeno doloroso: o abandono em massa da participação na igreja e, portanto, na missa dominical. As estatísticas sobre a prática religiosa são para fazer chorar. Isto não quer dizer que quem não vai à igreja necessariamente perdeu a fé. Não! O que acontece é que se substitui a religião instituída por Cristo pela chamada religião "a la carte". Nos Estados Unidos dizem "pick and choose", pegue e escolha. Como no supermercado.

 Fr. Raniero Cantalamessa

sexta-feira, 3 de junho de 2016

Por que um católico não deve consultar horóscopo?



O diabo não busca outra coisa senão fechar e obstruir a estrada de nosso retorno a Deus

A astrologia pretende definir a vida humana a partir da posição ocupada pelos astros no dia do nascimento da pessoa. A astrologia e o horóscopo são cultivados desde remotas épocas antes de Cristo, ou seja, desde a civilização dos caldeus da Mesopotâmia, por volta de 2500 a.C.. Nessa época, os estudiosos pouco sabiam a respeito do sistema solar e dos astros em geral.

Segundo o grande mestre D. Estevão Bettencourt, tal “ciência” é falsa por diversos motivos:

1 – Baseia-se na cosmologia geocêntrica de Ptolomeu; conta sete planetas apenas, entre os quais é enumerado o Sol;

2 – A existência das casas do horóscopo ou dos compartimentos do zodíaco é algo de totalmente arbitrário e irreal;

3 – Os astros existentes no cosmo são quase inumeráveis; conhece-se interferências deles no espaço que outrora se ignorava. É notório também o fato de que os astros modificam incessantemente a sua posição no espaço. Por que então a astrologia leva em conta a influência de uma constelação apenas?;

4 – A astrologia incute uma mentalidade fatalista e alienante, que deve ser combatida, pois não corresponde aos genuínos conceitos de Deus e do homem. Registram-se erros flagrantes de astrólogos. (Revista PR, Nº 266 – Ano 1983 – Pág. 49).

Uma pesquisa realizada nos EUA mostra que seguir os horóscopos “pode fazer mal à saúde mental”. O estudo foi publicado na revista “Journal of Consumer Research” e descobriu que pessoas que leem o horóscopo diariamente são mais propensas a um comportamento impulsivo ou a serem mais tolerantes com seus “desvios” quando a previsão do zodíaco é negativa. Cientistas das universidades Johns Hopkins e da Carolina do Norte recrutaram 188 indivíduos, que leram um horóscopo desfavorável. Os resultados mostraram que para as pessoas que acreditam que podem mudar o seu destino, um horóscopo desfavorável aumentou a probabilidade de elas caírem em alguma “tentação”. “Acreditava-se que, para uma pessoa que julga poder mudar o seu destino, o horóscopo deveria fazê-la tentar modificar alguma coisa em seu futuro”, disseram os autores da pesquisa. No entanto, viu-se o oposto: aqueles que acreditam no horóscopo, quando veem que a previsão é negativa, acabam cedendo às suas “tentações”, levando-os a um comportamento impulsivo e, eventualmente, irresponsável.

Uma prova do erro da astrologia é a desigualdade de sortes de crianças nascidas no mesmo lugar e no mesmo instante, até mesmo dos gêmeos. Veja por exemplo caso de Esaú e Jacó (Gen 25). Se os astros regem a vida dos homens, como não a regem uniformemente nos casos citados? Quem conhece os gêmeos sabem muito bem disso.


Santo Agostinho, já no século IV, combatia veementemente as superstições e a astrologia. No seu livro ‘A doutrina cristã’ escreve: “Todo homem livre vai consultar os tais astrólogos, paga-lhes para sair escravo de Marte, de Vênus ou quiçá de outros astros”.

Querer predizer os costumes, os atos e os eventos baseando-se sobre esse tipo de observação, é grande erro e desvario. O cristão deve repudiar e fugir completamente das artes dessa superstição malsã e nociva, baseada sobre maléfico acordo entre homens e demônios. Essas artes não são notoriamente instituídas para o amor de Deus e do próximo; fundamentam-se no desejo privado dos bens temporais e arruínam assim o coração.


Em doutrinas desse gênero, portanto, deve-se temer e evitar a sociedade com os demônios que, juntamente com seu príncipe, o diabo, não buscam outra coisa senão fechar e obstruir a estrada de nosso retorno a Deus.”

“Os astrólogos dizem: a causa inevitável do pecado vem do céu; Saturno e Marte são os responsáveis. Assim isentam o homem de toda falta e atribuem as culpas ao Criador, àquele que rege os céus e os astros” (Confissões, I, IV, c. 3).

“Um astrólogo não pode ter o privilégio de se enganar sempre”, dizia o sarcástico Voltaire.

“O interesse pelo horóscopo como também por Tarô, I Ching, Numerologia, Cabala, jogo de búzios, cartas etc. é alimentado por mentalidade que se pode dizer “mágica”. Quem se entrega à prática de tais processos de adivinhação, de certo modo, acredita estar subordinado a forças cegas e misteriosas; o cliente de tais instâncias se amedronta e dobra diante de poderes fictícios – o que não é cristão.” (D. Estevão)

São Tomás de Aquino, em sua obra “Exposição do Credo”, afirma que o demônio quer ser adorado, por isso se esconde atrás dos ídolos. E São Paulo diz que “as coisas que os pagãos sacrificam, sacrificam aos demônios e não a Deus” (1 Cor 10,21). Então, é preciso cuidado para não prestar um culto que não seja a Deus.

Prof. Felipe Aquino