Uma enfermeira australiana - Bronnie
Ware - escreveu um livro original. Tendo se dedicado a doentes terminais,
colecionou suas queixas, seus arrependimentos e seus sonhos não realizados.
Tinha consciência de que aquilo que foi ouvindo de uns e de outros ao longo de
alguns anos era muito mais do que meros desabafos, mas ela estava, sim, diante
de sentimentos profundos, de dores que machucavam, de vidas não vividas. Para
que o livro não se tornasse apenas um amontoado de depoimentos, organizou-os em
grandes grupos, aos quais denominou "Os cinco maiores arrependimentos à
beira da morte". São eles:
1º -
"Eu gostaria de ter tido a coragem de viver a vida que eu quisesse, não a
vida que os outros esperavam que eu vivesse". Segundo Ware, esse foi o
arrependimento mais comum. Diante da proximidade da morte, muitos olhavam para
trás e tomavam consciência do que gostariam de ter feito e não fizeram,
preocupados sempre com imposições externas ou com o desejo de querer agradar.
Em outras palavras, poderiam escolher para a lápide de sua sepultura a frase: "A
vida que poderia ter sido e não foi".
2º -
"Eu gostaria de não ter trabalhado tanto". Essa afirmação nascia
especialmente da boca de homens que tinham passado a vida envolvidos pelo
trabalho, pela luta para aumentar seu patrimônio ou para serem sempre mais famosos.
Percebiam, de repente, que não haviam acompanhado a infância e a juventude seus
filhos, que a família tinha ficado sempre em segundo plano, embora procurassem
se convencer, enquanto estavam em sua roda viva, que era para a esposa e os
filhos que tudo faziam.
3º -
"Eu queria ter tido a coragem de expressar meus sentimentos". Alguns
se arrependiam por não terem sido capazes de expressar seu amor e seu carinho
ou por não terem sido capazes de fazer elogios a quem os merecia. Outros
guardavam ressentimentos antigos, fazendo de seu coração um
"freezer", onde sua amargura estava congelada, sempre pronta a se
manifestar. Agora, se perguntavam: "Para quê? De que adiantou isso?"
4º -
"Eu gostaria de ter tido mais tempo para meus amigos". Muitos
descobriram que não haviam cultivado velhas e sinceras amizades, e que não era
naquela fase final da vida que iriam conseguir novos amigos.
5º -
"Eu gostaria de ter-me permito ser mais feliz". Expresso isso com
minhas palavras: o grande erro de muitas pessoas consiste em estragar a vida
com mesquinharias, com insatisfações não superadas, com o fechar-se em si
mesmas, num egoísmo que mata a alegria.
Percebe-se que a autora do livro, não
sei se premeditadamente, não entrou no campo espiritual, religioso. Por isso,
sem pretender completar seu interessante trabalho, mas como expressão do que
penso e acredito, faço duas observações envolvidas pela perspectiva da fé.
A primeira diz respeito a Santo
Agostinho. Para que todos o situem no tempo, lembro que ele morreu no ano 430.
Depois de uma vida atribulada em busca da verdade, escreveu os caminhos que
percorreu até encontrá-la, no livro autobiográfico "Confissões".
Começou constatando: "Criaste-nos para ti, Senhor, e inquieto está o nosso
coração enquanto não repousa em ti". E concluiu: "Tarde te amei,
Beleza tão antiga e tão nova; tarde te amei! Tu estavas dentro de mim e eu te
buscava fora de mim. (...) Tu estavas comigo, mas eu não estava contigo. (...)
Saboreei-te, e agora tenho fome e sede de ti. Tocaste-me, e inflamei-me na tua
paz."
A segunda observação é de Jesus
Cristo, e ele a apresentou sob a forma de uma pergunta: "De que adianta a
alguém ganhar o mundo inteiro, se vier a perder a própria vida?" (Mateus
16,26). Traduzindo isso em palavras muito pobres posso dizer: onde ficaram as
vaidades de muitos, os bens que acumularam - muitas vezes de maneira não honesta-,
os prazeres que dominaram suas vidas? O que fica de uma vida, além do amor
semeado? Oportuno é, pois, o pensamento que bem poderia servir de título para
um livro: "A vida nos é dada para procurar Deus; a morte, para
encontrá-lo; e a eternidade, para possuí-lo".
DOM MURILO
KRIEGER,scj - Arcebispo de São Salvador da Bahia, Primaz do Brasil
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