Jesus Cristo se manifestou pequeno e pobre, nascendo em
Belém, povoado simples e só aparentemente sem importância, pois “Tu, Belém,
terra de Judá, de modo algum és a menor entre as principais cidades de Judá,
porque de ti sairá um príncipe que será o pastor do meu povo, Israel” (Mt 2,
6). Tomou as vestes da simplicidade, manifestando o maior poder de Deus, que
vai ao mais profundo das realidades humanas, para resgatá-las em seu amor.
Chamado “Filho do Carpinteiro” José, aprendeu, ele mesmo,
uma profissão humana, trabalhador manual, para que as atividades humanas fossem
reconhecidas em sua inigualável dignidade. Nele, todo trabalho humano feito com
amor é reconhecido como contribuição na edificação do Reino de Deus. Nazaré foi
seu ambiente de crescimento na infância, adolescência e juventude, com tudo o
que significa convivência sadia, pois se fez igual a nós em tudo, menos no
pecado. Foi tão parecido que seus concidadãos se admiravam pela sabedoria com
que agia e falava (Cf. Mt 13, 54-55), tudo vindo de dentro, do amor infinito,
que é só de Deus, e ele é Deus!
Mãe Maria, ele a teve única entre todas as outras, preparada
pelo Pai do Céu para ser santa e imaculada. Numa pessoa, feminina em sua
doçura, mulher forte, experimentada na provação, formada nas estradas que foram
de Nazaré a Belém, ou passaram pelo Egito, peregrinaram a Jerusalém, foi
solícita em Caná e capaz de se fazer discípula do próprio Filho. Declarou-se
escrava e aí estava a sua felicidade, sua bem-aventurança. Na hora definitiva
da obra de salvação realizada e merecida pelo Senhor Salvador, estava de pé
junto à Cruz, colaboradora do Redentor. O amor que perpassou seus pensamentos,
palavras e gestos, conduziu-a ao testemunho do derramamento do Espírito Santo
no Pentecostes, ela que fora envolvida com a sombra do mesmo Espírito, para a
Encarnação do Verbo de Deus. Não fez “grandes” coisas, pois estas foram feitas
por Deus em sua história (Cf. Lc 1, 46-49). Sua vida é apenas e tão somente ser
a Mãe do Belo Amor, e o tudo de Deus se realiza em seus passos.
Um dia bonito raiou no Rio Jordão, quando sol, água, vozes,
pomba, tudo comparece para que se inaugure o ministério da vida pública de
Jesus, amor de Deus feito carne, Filho amado a ser acolhido e ouvido.
Testemunha-se ali a revelação da Trindade! É o amor que circula entre o Pai, o
Filho e o Espírito Santo. É a humanidade que em João Batista se inclina e quer
deixar-se batizar na nova e definitiva torrente que brota do Céu. É o amor de
Deus que se derrama, pelo Espírito Santo que nos é dado (Cf.Rm 5, 5).
O Messias foi aguardado com ansiedade por muitos séculos.
Era o desejo profundo da plena comunhão entre o Céu e a Terra! Só que muitas
pessoas o imaginavam poderoso nas batalhas, violento para destituir os
opressores! Neste sentido, Jesus decepciona tais expectativas, porque chega num
jumentinho, montaria dos pobres, ao invés dos garbosos cavalos dos vencedores
das guerras, ou dos dominadores enriquecidos pelo butim dos povos conquistados.
Ele vem como o Rei da Paz, aparentemente termina sua missão no fracasso da
morte e anunciou apenas o amor que realizou. Venceu a morte, sim, mas sua
ressurreição só é conhecida através do testemunho! Com ele só se pode
estabelecer relacionamento através do caminho da fé, que significa confiança
gratuita e absoluta e conduz ao amor livre e decidido entre Deus e os homens e
as mulheres que criou e entre estes, na reciprocidade do dom e da ternura.
Foi muito difícil para os discípulos de Jesus chegarem à
compreensão dos segredos do Mestre. Por três anos brotaram muitas interrogações
em seus corações, pelo fato de serem também herdeiros da expectativa do Povo de
Israel. Uma delas é a pergunta a respeito do “seu” mandamento, com a qual
pretendiam penetrar no mais íntimo do coração do Senhor (Cf. Jo 15, 9-17). Não
lhes revelou qualquer fórmula mágica para os problemas do mundo, mas deu-lhes
de presente o próprio Céu, o jeito de Deus viver: “Este é o meu mandamento:
Amai-vos uns aos outros, assim como eu vos amei” (Jo 15, 12). Trata-se de
acreditar que o Céu resolve os problemas da terra! É trazer para o dia a dia os
critérios de Deus, que nos ama por primeiro, quer para todos vida em
abundância, perdoa sempre com misericórdia, a ternura de Deus que vai ao
encontro de quem se perdeu.
Somos continuamente tentados pela eficiência, desejo de
resultados rápidos. Este fenômeno se verifica também nas decisões dos
governantes, com as promessas do consumo e do emprego aparentemente estável, ou
as políticas compensatórias, cujo preço chega e já chegou. Como se esvaiu um
admirável mundo novo que se proclamou realizado! E infelizmente muitos almejam
um mundo sem rédeas ou limites, religião reduzida à esfera privada, laicismo
militante, libertinagem à solta, apenas direitos e nenhuma responsabilidade,
desrespeito e eliminação da vida desde o ventre materno, desvalorização da
família, ideologia de gênero, propostas de mudanças sociais com viés socialista
nitidamente anacrônico.
A proposta do Evangelho pode soar ingênua, quando
acompanhamos o Jesus de Belém, da Galileia ou do Calvário! Só que não se chega
à ressurreição sem passar pela Cruz, loucura aos olhos humanos. Muitos que o
seguiram na primeira hora e em todos os tempos o deixaram de lado, pois não
oferece tais soluções fáceis. Quando Jesus propõe critérios de Céu, com a
disposição para dar a vida uns pelos outros, desmorona a pretensa competição de
quem quer derrubar o próximo, destruí-lo para que vença o grupo a que pertencem
os que se envolvem nas batalhas da vida. Quem o segue deverá escolher a força
da não violência, o amor simples e sincero que vai ao encontro dos outros, as
armas da paz, a queda das muralhas que separam as pessoas e o gosto pelo
diálogo.
Nestes dias, vale olhar para figuras tão simples quanto
emblemáticas na Igreja e na Sociedade, as Mães, cujo dia celebramos. A ternura
que revelam é um sinal precioso do amor de Deus. O profeta Isaías nos mostra em
palavras preciosas a linda comparação do amor de Deus com o amor materno: “Pode
uma mulher esquecer-se daquele que amamenta? Não ter ternura pelo fruto de suas
entranhas? E mesmo que ela o esquecesse, eu não te esqueceria nunca” (Is 49,
15). Às mães é confiado o tesouro da vida, conservado no íntimo de seu ventre,
e delas a vida recebe calor, estímulo, afeto e ternura. Sua coragem para cuidar
dos filhos, o zelo que muitas vezes faz assumir sozinhas a educação de seus
queridos, amor que não se explica, mas acontece e é cada dia mais intenso.
Nelas encontremos o testemunho e a verdadeira pregação do mandamento do amor.
Elas valem e mudam o mundo!
E por falar em família e ternura, o Papa Francisco, fez
justamente um apelo a um caminho diferente daquele que muitas vezes se percorre
no mundo: “Lembremo-nos de que o ódio, a inveja, o orgulho sujam a vida; então
guardar quer dizer vigiar sobre os nossos sentimentos, o nosso coração, porque
é dele que saem as boas ou as más intenções, aquelas que edificam e as que
destroem... Cuidar, guardar requer bondade, requer ser praticado com ternura...
Não devemos ter medo da bondade, da ternura!” (Cf. Homilia do dia 19 de Março
de 2013, Solenidade de São José). É jeito de Céu, é o mandamento do Amor!
Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo de Belém do Pará-Assessor Eclesiástico da RCCBRASIL