Admiro-me, cada vez mais, da significativa presença
e atuação das mulheres nas pastorais e movimentos de nossa Arquidiocese. Tenho
notado, também, quanto é importante e essencial o papel que exercem na própria
família. Dessas constatações, nasceu a reflexão que segue.
O homem e a mulher
foram criados à imagem e semelhança de Deus. Para a fé cristã, essa é uma
verdade fundamental e inquestionável. Somos pessoas, isto é, criaturas
racionais e livres, capazes de conhecer e amar o Criador. Só nos realizamos plenamente
no dom de nós mesmos a Deus e ao nosso próximo. Em suas pregações e em seu modo
de agir, Jesus deixava claro que tanto o homem como a mulher merecem o respeito
de todos, porque são iguais em dignidade. Hoje isso é aceito pacificamente; no
tempo de Jesus, contudo, era uma ideia revolucionária, pois a mulher era vista
como um ser inferior, sem direitos. O relacionamento que Jesus tinha com elas
despertava a atenção de todos, pois era marcado pela atenção, simplicidade e
transparência. Com elas conversava sobre os mistérios mais profundos do Reino
dos céus, como aconteceu em seu encontro com a Samaritana (cf. Jo 4). Falou-lhe
do dom que Deus lhe queria dar, qual fonte de água viva que jorra para a vida
eterna. Algumas mulheres acompanharam seus passos e com ele caminharam até o
Calvário. Mereceram, inclusive, uma advertência de sua parte: “Não choreis por
mim! Chorai por vós mesmas e por vossos filhos!” (Lc 23,28).
A dedicação e o
sofrimento dessas mulheres nos lembram as que hoje sofrem por inúmeros motivos.
Aliás, como há mulheres que sofrem! Além de tudo o que uma mulher enfrenta
enquanto espera um filho, é decisiva sua contribuição na formação da
personalidade desse novo ser. Quantos poderiam dar um belo testemunho a essa
respeito! É imensa a dívida que nós, homens, temos para com elas. Respeitar sua
dignidade e ajudá-las a viver sua vocação e missão é o mínimo que podemos fazer
em retribuição ao que delas recebemos. Mas podemos dar um passo a mais,
agradecendo ao Senhor por todas e cada uma das mulheres: pelas mães, irmãs e
esposas; pelas consagradas a Deus na vida religiosa; pelas que se dedicam aos
necessitados e doentes; pelas que exercem uma profissão e dão preciosa
contribuição na construção da sociedade; pelas que, sozinhas, assumem a
responsabilidade de sua família. Todas elas saíram do coração de Deus e tornam
nosso mundo mais poético e belo, mais rico e virtuoso. Diante dessas
colocações, poderia nascer uma pergunta: se Cristo valorizou tanto a dignidade
e a vocação da mulher, por que a Igreja não lhes possibilita a ordenação
sacerdotal e episcopal? A resposta é simples: agindo assim, a Igreja segue a
prática do próprio Jesus que, ao chamar os “Doze”, escolheu só homens. Só eles
estiveram com Jesus na última Ceia; só eles receberam o mandato sacramental:
“Fazei isto em minha memória” (Lc 22,19), ligado à instituição da eucaristia;
só eles, na tarde do dia da Ressurreição, receberam o Espírito Santo para
perdoar os pecados. Quem fez essa escolha foi aquele mesmo Jesus que sempre
agiu com liberdade e, superando a mentalidade reinante em seu tempo –
mentalidade antifeminista –, soube respeitar e enaltecer a mulher. Ao partir
para o Pai, Jesus ordenou a seus discípulos: “Ide e evangelizai todas as
nações!” Para cumprir essa missão, a Igreja volta seu olhar para as mulheres,
que podem dar uma colaboração inestimável nesse campo. Elas são como algumas
mulheres da Bíblia – como Maria, por exemplo, que soube acolher a proposta que
Deus lhe fazia e colaborou decisivamente para a vinda do Salvador ao mundo. Ela
se antecipou a nós no caminho da santidade. Nela, a Igreja já atingiu a
perfeição. Para os homens, a Virgem Santíssima testemunha a vocação e a
dignidade de cada mulher. Para as mulheres, ela é exemplo de filha e mãe, de
virgem e esposa, de mestra e discípula. Para todos, ela é um modelo perfeito de
vida cristã, pois nos precedeu no caminho da fé, da caridade e da união com
Cristo.
Dom Murilo S.R. Krieger
Arcebispo de Salvador (BA), Primaz do Brasil
Arcebispo de Salvador (BA), Primaz do Brasil
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