O Papa Francisco ofereceu à Igreja a Exortação Apostólica
Pós-Sinodal “Amoris Lætitia” (A alegria do amor), sobre o amor na família, como
fruto de duas Assembleias do Sínodo dos Bispos. Diz o Papa: “Apesar dos
numerosos sinais de crise no matrimônio, o desejo de família permanece vivo nas
jovens gerações. Como resposta a este anseio, o anúncio cristão que diz
respeito à família é deveras uma boa notícia”. Interpretações mundanas viram no
documento papal uma possível decepção, enquanto todos nós, filhos da Igreja,
descobrimos a projeção de um renovado sopro a favor da família. Quando muitos
especulavam, quem sabe sonhando colocar na boca da Igreja soluções radicais
para os problemas da família, independente dos extremismos correntes, o Santo
Padre oferece um verdadeiro hino ao amor na família, a ser entoado pelo coro
dos cristãos espalhados pelo mundo inteiro.
Papa Francisco aconselha uma leitura calma da Exortação
Apostólica, superando a tendência de uma compreensão apressada e superficial.
Ele mesmo acena aos casais a beleza do capítulo a respeito do amor no
matrimônio ou o texto sobre a fecundidade do amor. Os capítulos sobre as
perspectivas pastorais e o reforço da Educação dos filhos certamente atrairão
os agentes de Pastoral Familiar. Acompanhar, discernir e integrar a fragilidade
será a provocação positiva para todos os que buscam um caminho para evangelizar
a boa nova da família diante das situações difíceis e desafiadoras de nosso
tempo. E toda a Igreja celebrará as conclusões sobre a espiritualidade conjugal
e familiar, com a qual se conclui a Exortação Apostólica. Não há dúvidas de que
o Espírito Santo conduza a Igreja, o que se confirma mais uma vez, mostrando,
diante de um mundo em crise e repleto de confusões em todos os níveis, que
começa agora uma nova e esperançosa etapa de valorização da família, como foi
pensada por Deus.
Nas celebrações matrimoniais judaicas e cristãs, canta-se o
salmo da família (Sl 127), com o qual o Papa iniciou a Exortação Apostólica e queremos
ecoar com alegria: “Feliz quem teme o Senhor e segue seus caminhos. Viverás do
trabalho de tuas mãos, viverás feliz e satisfeito. Tua esposa será como uma
vinha fecunda no interior de tua casa; teus filhos, como brotos de oliveira ao
redor de tua mesa. Assim será abençoado o homem que teme o Senhor. De Sião o
Senhor te abençoe! Possas ver Jerusalém feliz todos os dias de tua vida. E
vejas os filhos de teus filhos. Paz sobre Israel!” É festa para a Igreja quando
pode oferecer as boas notícias. E elas estão dentro de nossas casas!
Vivemos neste final de semana a Festa do Bom Pastor, na qual
resplandecem as atitudes daquele que quer para todos a vida em abundância. Cabe
bem ver as parábolas, chamadas no seu conjunto de Parábola do Bom Pastor (Cf.
Jo 10, 1-30) dirigidas às famílias, acolhendo justamente o Evangelho da
Família, dirigido a toda a sociedade, que clama, tantas vezes sem consciência
clara, por tal novidade.
Com Jesus, que é a porta das ovelhas, queremos adentrar na
casa e no coração de todas as famílias. “Cruzemos o limiar desta casa serena,
com sua família sentada ao redor da mesa em dia de festa. No centro,
encontramos o casal formado pelo pai e pela mãe com toda a sua história de
amor” (Amoris lætitia 9). Nasça em nós um respeito profundo pela intimidade do
lar, com seus segredos, conselhos, liberdade, afeto! Quem ninguém entre na
família como o mercenário ou o salteador, mas seja ela reconhecida como espaço
sagrado! É hora de ser radicais, impedindo que entrem em nossas casas os
mercenários e ladrões, que roubam nada menos do que a nossa dignidade, para
espalhar, na praça pública do mundo, a história e os valores, ainda em
desenvolvimento, mas presentes em nossas famílias.
A vida em abundância entra pela porta da casa quando a
família acolhe Jesus. Ele é a porta e é aquele que vai à frente das ovelhas,
sejam elas o pai, a mãe ou os filhos. O alimento verdadeiro, que sustenta as
pessoas da família, tem um nome, que é o próprio Jesus, que é porta, sustento,
pastor, aquele que conduz à boa pastagem (Cf. Jo 10, 9). Muito antes de nossas
famílias existirem, o Senhor se entregou por elas e confirmou a bênção
primordial da família. A força de suas palavras o revela: “Nunca lestes que o
Criador, desde o princípio, os fez homem e mulher? Por isso deixará o homem o
pai e a mãe e se unirá à sua mulher, e eles serão uma só carne” (Gn 2, 24; Mt
19, 4; Cf. Amoris lætitia 9).
O bom pastor conhece as ovelhas! Aqui ele se torna
referência, mais uma vez, para a família. O lar é o lugar do conhecimento
profundo. Quantos pais e mães até se assustam (bendito susto!) quando seus
filhos se soltam quando estão em casa, parecendo até agressivos, como gente que
trata bem só quem é de fora. É que em casa os defeitos e as qualidades são
tocados com um amor que tudo cobre, tudo suporta e tudo perdoa! Em casa damos
uns para os outros a vida, e não firulas ou enfeites, feitos muitas vezes de
superficialidade. Benditas sejam as discussões, as lágrimas, e também os
abraços, beijos, sorrisos e afetos de quem se sente em casa! E o pastor que é
Jesus nos conhece, também porque garantiu estar presente entre aqueles que se
reúnem em seu nome (Cf. Mt 18, 20), não só quando rezam, mas em todas as
ocasiões.
A família tem também sua dimensão missionária. Certamente
muitos de nós temos a experiência de viver em famílias que agregam parentes e
conhecidos, atraindo gente que apenas se sente bem naquela casa, reunindo
amigos e conhecidos. As casas se tornam grandes, a ajuda a outras pessoas se
multiplica, há um gosto especial em estar juntos! Desejamos que nossas famílias
olhem para as outras, atraiam, para contribuírem de seu modo a fim de que venha
a existir um só rebanho e um só pastor.
O Papa Francisco põe em nossa boca uma belíssima oração,
dirigida à Sagrada Família, que oferecemos agora a todas as famílias: “Jesus,
Maria e José, em vós contemplamos o esplendor do verdadeiro amor. Confiantes, a
vós nos consagramos, Sagrada Família de Nazaré. Tornai também as nossas
famílias lugares de comunhão e cenáculos de oração. Autênticas escolhas do
Evangelho e pequenas igrejas domésticas. Sagrada Família de Nazaré, que nunca
mais haja nas famílias episódios de violência, de fechamento e divisão; e quem
tiver sido ferido ou escandalizado seja rapidamente consolado e curado. Sagrada
Família de Nazaré, fazei que todos nos tornemos conscientes do caráter sagrado
e inviolável da família, da sua beleza no projeto de Deus. Jesus, Maria e José,
ouvi-nos e acolhei a nossa súplica. Amém!
Dom Alberto Taveira Corrêa -
Arcebispo de Belém do Pará
Assessor Eclesiástico da
RCCBRASIL
Nenhum comentário:
Postar um comentário