Certa feita, Jesus
saiu de casa, onde se encontrava, em Cafarnaum, entrou numa barca, sentou-se
para contar suas parábolas. Pode-se imaginar a beleza da paisagem! Nas margens
do mesmo Lago, que chamavam de Mar da Galileia, havia chamado seus primeiros discípulos.
Do outro lado, pode-se ver a terra dos pagãos. Água, multidão, terra,
vizinhança dos pagãos, tudo contribui para que o tema do Reino de Deus seja
anunciado, abrindo os horizontes aos seus discípulos de então e os que viriam,
no correr dos séculos, entre os quais estamos nós. Podemos, então, encontrar o
nosso lugar no meio da multidão, para escutar uma das mais belas parábolas do
Evangelho, a história do Semeador. E, se somos discípulos, podemos apostar nas
explicações dadas pelo Mestre, aplicando-as à nossa vida, sem deixar cair pela
estrada nenhuma de suaspalavras!
“Vós, portanto,
ouvi o significado da parábola do semeador. A todo aquele que ouve a palavra do
Reino e não a compreende, vem o Maligno e rouba o que foi semeado em seu
coração; esse é o grão que foi semeado à beira do caminho. O que foi
semeado nas pedras é quem ouve a palavra e logo a recebe com alegria; mas não
tem raiz em si mesmo, é de momento: quando chega tribulação ou perseguição por
causa da palavra, ele desiste logo. O que foi semeado no meio dos espinhos é
quem ouve a palavra, mas as preocupações do mundo e a ilusão da riqueza sufocam
a palavra, e ele fica sem fruto. O que foi semeado em terra boa é quem ouve a
palavra e a entende; este produz fruto: um cem, outro sessenta e outro trinta”
(Mt 13,18-23).
Ouvir, compreender
e produzir fruto! Os primeiros escutam a Palavra e não a compreendem. Um
segundo grupo ouviu com alegria, mas faltam raízes, de modo que, pelas
dificuldades da vida e as perseguições, acabam desistindo. As preocupações do
mundo e a ilusão da riqueza também podem impedir os frutos. Enfim, ouvir,
compreender e produzir fruto é o grande desafio para o crescimento do Reino
deDeus.
Jesus saiu de casa
para as margens do lago. Sua cátedra é um barco, sua linguagem recolhe a
simplicidade dos acontecimentos. Ele mesmo é o Semeador que sai pelo mundo a
espalhar a boa semente do Reino de Deus. A nós foram oferecidas duas posições
diante da parábola do Semeador: de um lado, somos estrada, terreno, caminho,
espinhos, preocupações, terra boa. À nossa liberdade Deus entrega a grande
responsabilidade de reagir de forma coerente. Por outra parte, como os
discípulos da primeira hora, também a nós cabe “sair”, como o Senhor que sai de
casa ou o Semeador que sai a espalhar suas sementes. Não nos é possível ficar
acomodados, pensando que tudo já está feito e as estruturas do Reino de Deus e
de sua Igreja são estáveis e prontas para todos os desafios. A parábola, se bem
entendida, tem o condão para desacomodar todos os cristãos. Alguns passos
emergem da luz da Parábola do Semeador!
Diante de todas as
dificuldades, chamem-se elas pedras, preocupações do mundo, ilusão da riqueza,
superficialidade, o primeiro apelo da parábola é acreditar na qualidade da
semente lançada por Deus. Fora do amor e da bondade, Deus é absolutamente
incapaz! Sim, Ele só sabe fazer o bem, só pode plantar boas coisas em nós a no
mundo. Deus é bom, belo e verdadeiro! Não somos seus proprietários, mas filhos
e filhas, tendo à disposição toda uma reserva do bem infinito, da qual podemos
beber água pura!
Os discípulos de
hoje podem e devem fazer perguntas ao Senhor! Ele não foge das inquietações que
tomam conta de nosso coração. E sua Igreja, cuja vocação é anunciar a verdade
inteira, deve estar pronta para o diálogo com tudo o que o próprio Espírito
Santo suscita no coração dos seguidores de Jesus Cristo e na busca da verdade,
presente em todos os coraçõeshumanos.
Se a boa semente é
semeada, é óbvio perguntar-nos a respeito do acolhimento da Palavra semeada. É
hora de corrigir com prontidão a inconstância diante das dificuldades, a
negligência, a preguiça, as preocupações cotidianas e a ansiedade que nos tira
apaz.
Depois, a Igreja e
cada cristão hão de se colocar diante do empenho da evangelização. Trata-se de
saber comunicar de maneira nova e eficaz, com todos os meios lícitos e dignos,
na linguagem adequada, com franqueza, coerência decorrente do testemunho
autêntico. Precisamos de evangelizadores confiáveis e incansáveis, que não se
deixem vencer pelos obstáculos. O Evangelho se espalhou primeiro num mundo
pagão, e a Boa Nova se fez presente e atuante. O nosso mundo, eivado de
relativismo e indiferentismo, pode ser vencido pela força do Senhor Jesus
Cristo Crucificado e Ressuscitado, que envia sempre o seu Espírito Santo, para
que tenhamos no coração o mesmo ardor dos primeiros discípulos e a coragem dos
santos e dosmártires.
Entretanto, há um
trabalho artesanal a ser assumido por todos os cristãos e cada um, feito de
testemunho, presença, coragem. Trata-se de semear o bem, onde quer que
estejamos. Dizer um bom dia com sinceridade, agradecer, sorrir para as pessoas,
colocar em relevo o bem que as pessoas fazem, elogiar, saber corrigir com
delicadeza e por causa de Deus.
Vale ainda observar
que a avalanche de pessimismo reinante, quando não vemos uma luz no fundo do
túnel de nossa realidade social e política, começar a recolher os “caquinhos”
dos atos de amor e disposição para o serviço existentes em torno a nós, para
colocar à disposição de Deus, que pode, e só Ele, construir um mosaico, uma
verdadeira obra de arte, com tudo o que lhe oferecemos.
Rezemos com a
Igreja: Ó Deus, que mostrais a luz da verdade aos que erram, para retomarem o
bom caminho, dai a todos os que professam a fé rejeitar o que não convém ao
cristão, e abraçar tudo que é digno deste nome!
Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo de Belém do Pará
Assessor Eclesiástico da RCCBRASIL
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